17 maio, 2017

A máquina de Anticítera

Há mais de um século, nas areias do fundo do mar que cerca a ilha grega de Anticítera (ou, originalmente, Antikythera), um grupo de catadores de esponjas marinhas descobriu uma galé romana naufragada.
Há divergências sobre a data exata desta descoberta, mas ela teria ocorrido entre 1900 e 1902.
Entre os restos da galé romana, os catadores também encontraram um dos objetos mais desconcertantes e complexos do mundo antigo. Trata-se de um instrumento de bronze já muito corroído, feito há 2 mil anos, na Grécia antiga.
É conhecido como máquina (ou mecanismo) de Anticítera.


"Se não tivessem descoberto a máquina, ninguém teria imaginado, ou nem mesmo acreditado, que algo assim existisse, pois é muito sofisticada", disse à BBC o matemático Tony Freeth, da Universidade de Cardiff, que integra a equipe internacional que investigou o artefato.
E ele não está exagerando na descrição. Levou cerca de 1,5 mil anos até que algo parecido com a máquina de Anticítera voltasse a aparecer, na forma dos primeiros relógios mecânicos astronômicos, na Europa. "Se os cientistas gregos podiam produzir esses sistemas de engrenagens há dois milênios, toda a história da tecnologia do Ocidente tem que ser reescrita", acrescentou.
Anteriormente, por volta de 600 a.C., astrônomos babilônios haviam descoberto o ciclo de Saros, no qual a Lua e a Terra voltam a se encontrar a cada período de 223 luas (18 meses e 11 dias), o que prevê a ocorrência de eclipses.
"Quando havia um eclipse lunar, o rei babilônio deixava o posto e um substituto assumia o poder, de modo que os maus agouros fossem para ele. Logo o substituto era morto e o rei voltava a assumir sua posição", conta John Steele, especialista sobre a Babilônia no Museu Britânico.
Seria possível que os gregos antigos estivessem usando a máquina para seguir o movimento da Lua?
Ora, conhecer as fases da Lua era extremamente útil na época dos gregos antigos. Com base nelas, determinavam-se épocas de plantio, estratégias de batalha, festas religiosas, momentos de pagar dívidas e autorizações para viagens noturnas.
Os pesquisadores chegaram a esta conclusão: a máquina de Anticítera podia prever os eclipses. Não apenas o dia, mas a hora, direção da sombra e cor com a qual a Lua apareceria.
O ciclo de Saros depende do padrão da Lua, mas "nada sobre a Lua é simples", diz Freeth. "A Lua tem a órbita elíptica, assim ela viaja mais rapidamente quando está mais perto da Terra", exemplifica.
Podia, então, a máquina de Anticítera rastrear o caminho flutuante da Lua?
Sim, podia: duas engrenagens menores, uma delas com uma pinça para regular a velocidade de rotação, replicavam com precisão o tempo da trajetória que o satélite natural executa ao redor da Terra; e outra, com 26 dentes e meio, computava o deslocamento dessa órbita.
Ao examinar a parte frontal do aparelho, os investigadores concluíram que ele demonstrava como os gregos entendiam o Universo naquele momento: a Terra no centro e cinco planetas ao redor. E o movimento dos cinco planetas que podiam ser vistos a olho nu: Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter e Saturno
"Era uma ideia extraordinária: pegar teorias científicas da época e mecanizá-las para ver o que aconteceria dias, meses e décadas depois", diz o matemático.
"Essencialmente, foi a primeira vez que a raça humana criou um computador", acrescenta Freeth. "É incrível como um cientista daquela época descobriu como usar engrenagens para rastrear os complexos movimentos da Lua e dos planetas".


Hoje, no Google: uma homenagem (doodle) à máquina de Anticítera que, dois mil anos atrás, ajudou o homem a abrir o céu do conhecimento para a astronomia e a computação.

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