18 agosto, 2021

Carajás futuro sombrio

PUBLICADO POR LÚCIO FLÁVIO PINTO ⋅ 16 DE AGOSTO DE 2021

Francisco Fonseca é das poucas pessoas no Brasil que pode escrever o texto a seguir publicado: extremamente didático, rigoroso na seleção e apresentação dos fatos, com visão crítica profunda e abrangente, que conta a história da província mineral de Carajás, a mais importante do mundo, retrata a sua situação atual e faz uma projeção para os próximos anos, com conhecimento de causa e excelente formação científica.
Espero que o leitor aproveite esse presente de Francisco e alguém no governo e na iniciativa privada o utilize em suas ações relativas ao uso dos recursos naturais da Amazônia.

CARAJÁS

Francisco F. A. Fonseca (Engenheiro de Minas)

Carajás é a província ferrífera mais rica do mundo. É um conjunto de jazidas de ferro gigantescas, de alto teor, com ótimas características metalúrgicas, fáceis de minerar; não existe nenhuma outra igual no planeta. Carajás foi descoberto em julho de 1967 pelo meu amigo, o geólogo paulista Breno Augusto dos Santos, que comandava uma dupla de mais dois geólogos, o Erasto B de Almeida e o João E. Ritter.

Eles estavam procurando manganês no sudeste do Pará, que na época era totalmente coberto pela floresta amazônica, mas as fotos aéreas mostravam grandes clareiras no alto da Serra dos Carajás. O Projeto Araguaia tinha interpretado erradamente estas clareiras como resultado de formações calcárias. Eram oito clareiras mais ao norte e uma longa clareira com 35 Km de comprimento 70 Km mais ao sul, além de um grande número de clareiras pequenas se estendendo por uma frente de uns 200 Km.

Em 1967, a Companhia Meridional de Mineração, subsidiária brasileira da gigante norte americana United States Steel (US Steel), resolveu procurar manganês na Amazônia. A sua concorrente nos Estados Unidos, a Bethlem Steel, era sócia com 49% da ICOMI, que minerava manganês na Serra do Navio, no Amapá. A Meridional minerava manganês em Lafaiete, Minas Gerais, mas era uma mina em exaustão, e Urucum, no antigo Mato Grosso (hoje Mato Grosso do Sul).

O manganês é um insumo essencial para a produção de aço (steel é aço em inglês). Não existem jazidas de manganês no continente norte americano. As maiores jazidas estão na África e no Brasil. Existe também uma jazida grande na Ucrânia, que na época era parte da União Soviética. e os americanos ficavam de cabeça quente.

A Meridional contratou o geólogo americano Gene Tolbert, ex-professor da Universidade de São Paulo, e do quadro do USGS, para fazer o plano de procurar manganês na Amazônia, e ele decidiu que a melhor área era o sudeste do Pará. Ele bolou um plano maluco de percorrer a área com dois pequenos helicópteros que conduziam só o piloto e um geólogo.

Era uma maluquice com aqueles helicópteros de um motor só e ainda carregando combustível extra para reabastecer. Apenas o Breno era ex-aluno do Tolbert, mas os três geólogos, imbuídos daquele arroubo da juventude, embarcaram na aventura. Pouco mais de um mês depois o Breno e o piloto José Maria de Aguiar programaram um voo no qual tinham que descer para reabastecimento em uma pequena clareira na Serra Arqueada, a oeste da Serra dos Carajás.

O Breno, armado com seu martelo de geólogo, logo constatou que as árvores não cresciam ali porque a clareira era formada por minério de ferro. Ele estava procurando manganês, que é preto, e não minério de ferro, que é vermelho, mas ficou imaginando se as grandes clareiras mais a oeste não seriam também de minério de ferro e não de calcário, como tinham imaginado os técnicos do Projeto Araguaia.

Quando os dois helicópteros ficaram disponíveis, ele e os outros dois geólogos, o Erasto e o Ritter, percorreram todas as grandes clareiras da Serra dos Carajás, inclusive a clareira gigante de mais de 30 Km, que fica bem mais ao sul. Constataram que era tudo minério de ferro. Ficaram abismados.

Tolbert, de início não se interessou pelo ferro. Mas após a descoberta do manganês de Buritirama, o Breno chamou o Tolbert, que veio do Rio de Janeiro. Tal era o desinteresse pelo ferro, que só após a visita a Buritirama, no dia seguinte, visitou as clareiras com ferro. E só então ficou mais abismado com o que viu. A notícia da grandeza da descoberta logo se espalhou.

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(matéria enviada pelo colaborador Jaime Nogueira)

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