16 fevereiro, 2012

A aposta

por Fernando Gurgel Filho
Tem turista que beira o ridículo ao explorar as habilidades dos moradores do lugar. Estes querem apenas um pouco de atenção e, óbvio, ganhar uns trocados. Sabedores disso, alguns turistas chegam a ser muito cruéis e os exploram ao máximo.
Em uma barraca de praia, em Ilhéus, um dos atendentes era o Chicão, que gostava de exibir seu conhecimento de TODAS as capitais de TODOS os países do mundo.
Mas a sua maior habilidade era a de quebrar cocos com a mão. Sua habilidade era tanta que, segundo ele, se exibiu até no Fantástico.
Hoje está adoentado e abandonado à própria sorte.
Quando estava no auge, um belo dia, um grupo de turistas resolveu se divertir com o Chicão, dando-lhe um dos cocos mais duros que encontraram:
- Duas cervejas se você conseguir quebrar este!
Chicão topou, quebrou o coco com alguma dificuldade, nós dos dedos sangrando e as máquinas fotográficas dos turistas explodindo de alegria.
Um cliente antigo do Chicão, sentado numa mesa ao lado, ficou incomodado com a cena e chamou o Chicão:
- Aposta com esses idiotas que eu, Zeildo, negão baiano, jogo um coco para o alto e pego no dente.
Chicão, mesmo contra a vontade porque não queria que seu protetor se ferisse, fez a aposta e, claro, os turistas toparam imediatamente.
Zeildo chegou e acertou os detalhes, repetindo:
- Vou jogar um coco para o alto e pegar no dente. Todos de acordo?
Todos concordaram.
- Outra coisa, a aposta é com o Chicão, eu não quero nada.
Apenas uma senhora mais bem intencionada pediu para o Zeildo desistir, pois "tinha uns dentes tão bonitos" e falou que não queria ver aquilo.
Os outros não deram bola, queriam ver sangue e o Zeildo pediu para escolherem o coco. Deram-lhe um dos maiores e mais pesado. Zeildo tomou-o na mão direita e os turistas apontaram suas máquinas fotográficas. Fez que procurava a direção do vento com o indicador da mão esquerda, virou para o outro lado e os turistas todos se posicionaram em sua frente. Juntou mais turistas de outras mesas. Balançou o coco para cima e para baixo, observou novamente a direção do vento e, vagarosamente, virou para o lado da praia, com os turistas correndo para pegarem o melhor ângulo. Pediu para o pessoal se afastar um pouco, abrindo uma roda na sua frente. Sob intenso pipocar de flashes e gritos de alegria Zeildo, por fim, jogou o coco o mais alto que podia.
Colocou a mão direita nas costas e, com a mão esquerda, pegou no dente da frente.
Quando o coco desceu, numa velocidade vertiginosa, mais flashes e mais gritos.
O coco caiu no chão.
Silêncio total, as máquinas fotográficas paralisadas sob o olhar abobalhado dos turistas.
- Cadê?, falou alguém, entre acanhado e perplexo.
Ante a gargalhada do Chicão, que entendeu a brincadeira, Zeildo mostrou a todos que ainda estava pegando no dente.
Os dois quase foram linchados, os turistas deram queixa ao dono da barraca, pois "estavam sendo feitos de bobos", mas Zeildo exigiu o pagamento da aposta para o Chicão.
Um dos turistas mais exxxpertos gritou:
- Deixa de onda, cê falou que ia agarrar o coco com os dentes e não fez nada disso!
Zeildo pediu gentilmente para não mudarem o que foi combinado:
- Todos aqui devem se lembrar que falei apenas que ia jogar um coco para o alto e pegar no dente, certo? Então? Joguei o coco bem alto e ainda fiquei um tempão pegando no dente para dar tempo de todos fotografarem, não fiquei? Portanto, meus caros, trato cumprido, favor pagarem a aposta para o Chicão.
A confusão aumentou, mas, no fim, os turistas, quase fora de si, se descabelando e desmoralizados, foram obrigados a pagar a aposta para os nativos.
Que se divertiram com as cervejas grátis e se divertem até hoje com a história.

2 comentários:

Nelson Cunha disse...

Sei de uma anedota em que o apostador surpreende o infeliz derrotado ao prometer morder o próprio olho.
Saca o olho de vidro e morde-o para espanto da audiência .
Repete a aposta com o outro olho e ganha novamente
ao morder o olho desta vez com a dentadura.

Paulo Gurgel disse...

Aposto como houve essa aposta.