26 março, 2010

Lapsos de memória

É das piores a minha memória fisionômica. E, com muita frequência, me vejo em situação desconfortável quando alguém me aborda para uma interlocução. Conheço ou não conheço aquela pessoa toda prosa, ali postada à minha frente? Sim, devo conhecê-la, mas... de onde? qual o seu nome? Aí, fico ora fechado em copas, ora a comentar generalidades que não deixem a descoberto o meu lapsus memoriae. Na esperança de que, a qualquer momento, apareça uma pista que me leve a tratar o interlocutor pelo nome.
Ao menos isso. Pois nada é mais doce do que ouvir o nosso nome da boca de outrem. Essa frase, provavelmente dita por Mel Brooks, constitui uma grande verdade. Não adianta você ser amável, puxar um papo legal, se não sabe tratar o outro pelo nome. E fica meio esquisito pedir uma nova apresentação.
Dou exemplos de umas pistas que, por vezes, me socorrem: um remédio que obrou milagre (ah, é paciente), uma crônica que viu no jornal (ah, é leitor), uma plenária no sindicato (ah, é colega), um conselho para me cuidar (ah, é minha mãe). Exagero, leitor. Até o momento em que redijo estas linhas ainda não passei pelo último vexame.
Sou levado a apanhar um pouco mais da memória quando encontro alguém fora do contexto habitual. Mas acredito que isso não aconteça apenas comigo. Reconheceria você se encontrasse: o seu açougueiro num restaurante vegetariano? o seu confessor num cabaré? o seu personal trainer num spa?
Sem ser masoquista, apanho ainda mais quando é alguém do sexo oposto. Tantos são os recursos que a mulher usa para se embelezar e que a deixam muito diferente. Penteados, maquiagem, lentes de contato coloridas, lipoescultura etc. Ah, só a voz é que continua a mesma (como dizia um anúncio na TV). Após o que fico eu pensando que sou mesmo um inepto para a arte da galanteria.
Parafraseando Terêncio, eu diria que tudo que é humano me é estranho. O nordestino tem um nome para isso: "ariado" (com origem em "alheiado"), que é como eu fico em muitas dessas situações. Longe de ser uma vantagem, constitui o fato um handicap. Eu nunca poderei ser um relações públicas, por exemplo. Político, nem pensar. A não ser biônico, vice ou suplente de senador.
Já notei que duas coisas conseguem me avivar a memória. Uma é receber uma advertência pela má memória. O que me faz caprichar na memorização fisionômica da pessoa para que o problema não mais se repita. A outra é ver a pessoa, ainda que a conheça apenas de vista, metida em alguma confusão...
Diabéisso? Serei eu um filho natural da Candinha?
PGCS

31 maio 2015 - Nem tudo está perdido
As memórias apagadas por uma amnésia não se perdem para sempre, mas ficam apenas inacessíveis e podem ser recuperadas, de acordo com uma nova pesquisa publicada nesta quinta-feira, 28, na revista Science. Em um experimento com camundongos, os autores do estudo conseguiram fazer com que os animais recuperassem memórias que haviam sido apagadas.

Um comentário:

Nelson Cunha disse...

Durante um encontro entre amigos, na casa de um deles, foi ficando ostensiva a maneira apaixonada com que o dono da casa tratava a esposa.

- Meu bem, busca uma geladinha pra nóis, viu?
- Amoooôr, tem tiragosto aí na cunzinha?
- Queridáaaaa. Baixa o som aí, pra nóis prozear.

Ao final da conversa, o visitante incluiu nas despedidas um elogio pela harmonia entre o casal. Confessou que nunca havia visto tanto carinho num casamento de 50 anos.

Ao que o dono da casa respondeu.

- Num é carinho porra nenhuma não. Tô com um principio de Auzaime e num consigo lembrar o nome dessa fia da puta.