25 março, 2012

URUGUAI E ARGENTINA. Notas de viagem 3 e 4

por Nelson José Cunha
3
Em Buenos Aires nosso Real é real. É aceito como o dólar latino-americano. As lojas estão cheias de brasileiros porque não fazemos turismo, fazemos compras. Na Av. Corrientes há mais livrarias do que em Belo Horizonte, mas os nossos turistas passam ao largo. Perguntei a um livreiro o que compram os brasileiros. Ele me disse: livro sobre churrasco. Os museus tambem não conhecem essa gente morena que vem dos trópicos, estamos todos muito ocupados com as grifes. Para os novos ricos, cultura é coisa de esnobes. Em nossas escolas, o bom aluno é visto pelos colegas com desprezo. É nerd ou CDF. O bom empregado é chamado de puxa-saco. Invejado é o malandro, o expéeeerto, no sotaque carioca. Parafraseando Nelson Rodrigues (que estaria fazendo 100 anos), somos riquinhos, mas ordinários. (*)
4
Uruguai e Argentina têm a mesma matriz cultural, racial e climática. São mais iguais do que o Paraná e o Ceará. O que os separa é um rio e o futebol. Até o "jeísmo" ( pronúncia do "y" como "jota") é igual. Duas grandes cidades, uma de cada lado do rio, forçosamente resultariam em grande movimentação de pessoas, e isso acontece. A polícia de fronteira especializou-se em aborrecer quem se atreve a atravessar o rio. Carimbos, documentos, revistas pessoais e escaneamento de bagagem são obrigatórios em cada margem do rio. Filas imensas se formam para agrado da burocracia que entra em êxtase com aquela visão de subjugados, enfileirados cidadãos cujo único pecado é o atrevimento de querer cruzar um rio. A uma centena de quilômetros dali, na ponte General San Martin, cruza-se a fronteira com um aceno para o guarda, que, rendido pelo tédio, nem responde. É a "burrocracia" latino-americana em evidência.
(março de 2012)

(*) Esta palavra (ordinário) é para ser entendida como pessoa comum, trivial, sem brilho. É claro que tambem não é um elogio ao nosso caráter. Faço essa observação porque, se tomada pelo sentido mais usado - canalha, safado - soaria como ofensiva, o que seria extremamente injusto. Também não somos assim, temos, como povo, outras grandes qualidades. NJC

Um comentário:

Nelson Cunha disse...

Paulo,
A palavra " ordinário " usada no parágrafo primeiro é para ser entendida como pessoa comum, trivial, sem brilho. É claro que tambem não é um elogio ao nosso caráter.
Faço essa observação porque se tomada pelo sentido mais usado - canalha, safado - soaria como ofensiva o que seria extremamente injusto. Tambem não somos assim, temos , como povo, outras grandes qualidades.