27 dezembro, 2006

Medicina com rodízio - 2

A MORTE COM DATA ANUNCIADA
Um dos contemporâneos meus na Faculdade de Medicina foi o Heramar (o nome não está sendo protegido, nem os seus pacientes estavam).
Heramar não parecia ter o raciocínio muito certo, segundo se dizia. Certa vez, uns colegas seus que haviam alugado uma quitinete nas proximidades da Faculdade de Medicina, resolveram inaugurá-la solenemente. A inauguração daquilo que seria um “abatedouro de lebres” e, ao mesmo tempo, um Centro de Altos Estudos (com o nome completo do Heramar). Só que este, levando a coisa a sério, sentindo-se muito lisonjeado e tal, foi à inauguração. E lá discursou até a hora em que foram servidos refrigerantes e salgadinhos.
Mas, interessa que o nosso aprendiz de médico estava às voltas com um caso difícil num dos leitos do Hospital das Clínicas. E multiplicava-se em cuidados para salvar aquela vida. Com freqüência, ele era visto nos corredores do hospital, angustiado e dizendo:
- Oh, meu Deus, tomara que este paciente não morra...
Com o passar dos dias, agravando-se cada vez mais o estado do seu paciente, a despeito dos cuidados que Heramar lhe devotava, uma sutil diferença foi notada. O futuro doutor, talvez já consciente das limitações da profissão que ia abraçar, havia mudado o teor da sua lamentação.
- Oh, meu Deus, tomara que este paciente não morra... até o dia 18.
O exato dia em que, por força do rodízio no internato, estaria em outra clínica. E que, por isso, não estaria para receber a ceifadeira de vidas em seu afã de destruir reputações.


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