04 julho, 2013

Primo Levi. É ISTO UM HOMEM?

por Fernando Gurgel Filho
Dizem que sobreviventes são pessoas extremamente perigosas.
Talvez seja pelo fato de que, quando se chega ao fundo do poço, quando nada mais resta ao ser humano, nada mesmo, e se este sobrevive, resta um ser humano completamente livre e fortalecido para qualquer situação do cotidiano. O embate, às vezes cruel, do dia a dia torna-se apenas um leve e aprazível afazer cotidiano, e a vida, merecidas férias no paraíso terrestre.
Os que passaram pelas atrocidades dos campos de concentração nazistas e saíram vivos bem sabem disso.
Estes, antes de serem sobreviventes, foram aniquilados como seres humanos. Foram colocados em condições extremas de miséria humana, aonde o mais absurdo dos mais abjetos comportamentos puderam ser observados entre "aquilo" que, ainda há pouco, fora dos campos de concentração, era chamado de "ser humano".
Primo Levi, no livro "É Isto Um Homem?", conta-nos sua história no campo de concentração de Auschwitz. O livro, escrito logo depois de sua libertação e publicado em 1947, é um relato fiel de lembranças ainda bem nítidas de como seres humanos conseguem transformar outros seres humanos em lixo e coisas inúteis, apenas porque esses outros seres humanos não estão do mesmo lado de suas convicções, seja política/religiosa, seja porque não nasceram sob a mesma bandeira, com as mesmas características, mesmas caspas, mesmo chulé.
Ao entrar em Auschwitz lia-se no grande portão de entrada "ARBEIT MACHT FREI" - O trabalho liberta.


Conta Primo Levi que a lembrança daquela frase singela "ainda hoje me atormenta nos sonhos".
Auschwitz não era um campo de concentração comum - o que, por si só, seria uma vergonha para a humanidade - era um campo de extermínio. Ou seja, a possibilidade de um ser humano entrar lá e sair com vida era nula. Com o tempo - pouco tempo, diga-se de passagem -, a iminência da morte era uma constante e a degradação do ser humano chegava a pontos inimagináveis. De ambos os lados, tantos prisioneiros como seus carrascos.
Talvez não por acaso, ao terminar de ler este pequeno grande livro, lembrei-me imediatamente de um outro, "Vidas Secas". Do muito conhecido brasileiro Graciliano Ramos. Ali vemos como foram produzidos milhares e milhares de sobreviventes.
Lembrei-me também dos porões da ditadura brasileira, tão recente e tão esquecida dos brasileiros. Menos por aqueles que foram colocados abaixo da linha da miséria humana. Ali também foram produzidos milhares e milhares de sobreviventes.
Será que, um dia, a humanidade poderá se livrar dessas ameaças?
Apenas os jovens poderão nos dar essa resposta.

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