Quando fiz 14 anos eu a matei novamente. Não a queria me impondo regras ou limites, nem que me impedisse de viver a plenitude dos voos juvenis. Mas logo no primeiro porre eu felizmente a redescobri viva, foi quando ela não só me curou da ressaca como impediu que eu levasse uma vergonhosa surra de meu pai.
Aos 18 anos ache que mataria minha mãe definitivamente, sem chances para ressurreição. Entrara na faculdade, iria morar em república, faria política estudantil, atividades em que a presença materna não cabia em nenhuma hipótese. Ledo engano: quando me descobri confuso sobre qual rumo seguir voltei à casa materna, único espaço possível de guarida e compreensão.
Aos 23 anos me dei conta de que a morte materna era possível, apenas requeria lentidão... Foi quando me casei, finquei bandeira na independência e segui viagem. Mas bastou nascer meu primeiro filho para descobrir que o bicho mãe se transformara numa espécie ainda mais vigorosa chamada avó.
Para quem ainda não viveu a experiência, avó é mãe em dose dupla. . .
Apesar de tudo continuei acreditando na tese da morte lenta e demorada e, aos poucos, fui me sentindo mais distante e autônomo, mesmo que a intervalos regulares ela aparecesse em minha vida desempenhando papéis importantes e únicos, papéis que somente ela poderia protagonizar.
Mas o final da história, ao contrário de que eu sempre imaginei, foi ela quem definiu: quando menos esperava, ela decidiu morrer. Assim sem mais nem menos, sem pedir licença ou permissão, sem data marcada ou ocasião para despedida.
Ela simplesmente se foi, deixando a lição que mães são para sempre. Ao contrário do que sempre imaginei, são elas que decidem o quanto esta eternidade pode durar em vida e o quanto fica relegado para o etéreo terreno da saudade."
Minha mãe ainda não decidiu morrer, felizmente. Aquelas que o fizeram, ao partirem para o "etéreo terreno da saudade", deixaram com seus filhos esta lição e muitas outras.
Enviou-me a crônica acima (cujo autor não é identificado) o genealogista Ormuz Simonetti.
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