As arraias (ou "raias" como pronunciavam os moleques), as quais, em outras partes do Brasil, seriam chamadas de pipas, pandorgas ou papagaios.
Para a confecção de uma delas, não se necessitava de muita coisa. Palitos secos de coqueiro, linha, papel-seda e um pouco de grude. Com os palitos secos, em número de três, amarrados nos cruzamentos por pedaços de linha (e com um destes pedaços utilizado para delimitar o perímetro) fazia-se o esqueleto da arraia. A seguir, nesta armação se colavam os retalhos do papel-seda por meio de um grude preparado na cozinha de casa.
Os complementos do brinquedo eram o cabresto e o rabo da arraia. Para o cabresto, que servia para prender a arraia, bastava um pequeno pedaço de linha. E, para o rabo da arraia, além de uma maior porção de linha, à qual se atavam pequenas tiras de pano (molambo era o ideal), a intervalos regulares, ficando uma tira maior, a ponteira, para ser colocada no final da linha. O rabo (ou rabiola) era então preso na extremidade da arraia para lhe conferir estabilidade. Sem ele, ao ser posta no ar, a arraia ficaria a girar loucamente e sem ganhar altura.
Havia uma versão gigante da arraia, o paquetão, cujo esqueleto era feito de taboca. O qual era colocado no ar apenas por quem tinha a robustez suficiente para controlá-lo. E existiam também as bolachinhas, umas imitações baratas das arraias, que serviam de divertimento para as crianças menores. Feitas de algum papel grosso, cortado na forma redonda, e a seguir perfurado por palitos de coqueiro que funcionavam como armação, eram feias e não ganhavam grande altura.

Empinava-se a arraia com a ajuda de um companheiro que a elevava bem acima da cabeça. Até que, a um sopro mais forte do vento, a arraia era largada enquanto o outro a puxava. O outro era o dono da arraia que, muitas vezes, tinha de correr contra o vento para que ela subisse. Não havendo o auxílio de um companheiro para empiná-la, a alternativa era o "soltador" de arraia se posicionar num local elevado como um muro ou o terraço de casa.
E a arraia subia em movimentos coleantes sob o incentivo de repetidos puxões aplicados em sua linha. Com esta, a cada instante, sendo liberada de um carretel que rolava entre os dedos do "soltador". Até que a arraia se encontrasse na altura desejada (ou a linha chegasse ao fim). Neste ponto, começava o bonito espetáculo da arraia a movimentar-se no espaço em resposta aos "lanceios" feitos no chão.
Uns contentavam-se com esse aspecto "pacífico" da brincadeira. Outros, porém, preferiam praticar o "corte" de arraias. Uma peleja entre arraias em que, ao cruzamento das linhas, uma delas (às vezes, ambas) sofria o "corte". E, ficando sem o controle da linha que a prendia, passava a ser arrastada pelo vento até terminar enganchada num fio elétrico, árvore ou telhado. Sendo, nessa "agonia", acompanhada pelos moleques em louca correria como se fora um troféu.
A muitos frustrava a arraia "cortada" ser também "aparada". Quando essa arraia "derrotada" não caía em domínio público, por haver sido em pleno ar capturada e recolhida pela arraia "vencedora", graças à habilidade do dono desta.
Não seria possível o "corte" de arraias sem a participação do cerol. Preparado com vidro moído e cola derretida, assim que secava na linha em que era aplicado, o cerol a transformava num instrumento verdadeiramente cortante. Capaz de causar acidentes nos brincantes e em terceiros, aliás, como acontece até hoje. E, o que é pior, com alguns destes acidentes a se mostrarem terrivelmente letais.
3 comentários:
Realmente esta obra de Andruchak é fantástica, assim como todos os seus trabalhos o são. Recentemente vi um de seus projetos no http://artebrasilmais.blogspot.com que me fez repensar. Vale a pena dar uma espiada.
Nossa seu trabalho é ótimo me faz pairar no tempo lendo os textos falando das pipas e arraias ainda lembro como se fosse hoje a famosa época da arraia embora eu não more mais em fortaleza mais nunca deixei de um ser menino continuo com a arraia embora onde eu more pareça ser um pouco diferente rssr obg e ótimo trabalho!
Obrigado a Jandira e a Kettlen pelas visitas ao blog e pelos comentários aqui inseridos.
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