"O mundo moderno começou em 29 de maio de 1919, quando fotografias de um eclipse solar, tiradas na Ilha do Príncipe, na África Ocidental, e em Sobral, no Brasil, confirmaram a veracidade da nova teoria do universo." (Paul Johnson, historiador inglês, autor do livro
"Modern Times: The World from the Twenties to the Nineties").
A cidade entrou para o cenário mundial como palco da descoberta mais importante da Física: a Teoria da Relatividade. Um marco que se estendeu para todas as áreas do conhecimento. O absolutismo de Newton deu lugar ao relativismo de Einstein.
Anunciada em 1905, a Teoria da Relatividade de Albert Einstein afirmava que a massa dos corpos deforma o espaço próximo a eles, de modo que um raio luminoso é desviado pela deformação. Esta "curvatura da luz" só poderia ser observada através de um eclipse total do Sol, ou seja, quando a lua fica entre o Sol e a Terra, projetando sua sombra em parte da Terra. Com o eclipse, a luz ofuscante do Sol desaparece e se pode ver o brilho das estrelas próximas.
Para confirmar a "curvatura da luz", e consequentemente, comprovar a Teoria da Relatividade, algumas expedições científicas foram organizadas. Seguindo as previsões de eclipses, os cientistas rumaram para locais específicos. Mas suas tentativas foram frustadas. Uma expedição alemã de 1914, por exemplo, foi impedida por questões políticas. O mau tempo atrapalhou outra, de origem argentina, criada em 1916.
Para o dia 29 de maio de 1919, houve a previsão de um novo eclipse. Os estudiosos realizaram uma busca por locais que oferecessem as melhores condições geográficas para se observar o fenômeno. A cidade de Sobral, no Ceará, e a Ilha do Príncipe, na costa ocidental da África, eram os lugares ideais. Duas expedições foram enviadas. Aquela destinada à Sobral era composta por cientistas norte-americanos, brasileiros e ingleses do Observatório de Greenwich.
As experiências na Ilha do Príncipe não foram muito bem sucedidas. Houve uma tempestade. Nuvens ficaram à frente dos astros. As de Sobral, no entanto, puderam ser consideradas um sucesso.
O método de observação era simples. No momento em que a Lua cobriu o Sol, várias chapas fotográficas, de câmeras acopladas a telescópios, foram tiradas em sucessão, para registrar a posição das estrelas que estivessem visualmente próximas da coroa solar. Depois, estas fotos foram comparadas a chapas parecidas, tiradas três meses depois, durante a noite. A conclusão foi a de que Einstein estava certo. A luz faz realmente uma curvatura.
O dia que virou noite
Sobral viveu em 29 de maio de 1919 um de seus mais peculiares dias. No início daquela manhã, a população foi às ruas. Os sobralenses misturaram-se a vizinhos de outras localidades para conferir o anunciado fenômeno que tomaria conta dos céus. Para uns, o "fim do mundo". Para outros, "um milagre". Os mais esclarecidos sabiam que se tratava de um eclipse total do Sol.
Os sobralenses espantaram-se com os visitantes estrangeiros, que utilizavam toda a sua parafernália de equipamentos, instalados em plena praça, na frente da Igreja do Patrocínio. Os cientistas estavam extremamente ansiosos pois o dia amanhecera nublado. Mas as nuvens, que pareciam tentar esconder o eclipse, logo se afastaram.
No ápice do fenômeno, às oito horas e 56 segundos, o dia escureceu. Confusos, os galos cantaram como se fosse noite. Nos rostos da população, a estampa do medo. Ouvia-se a cacofonia de vozes assustadas, murmurando preces tão desesperadas que nem sempre podiam ser compreendidas. As orações misturavam-se ao estalar de pernas na correria em direção à proteção da Igreja.
No entanto, as faces dos cientistas expressavam sorrisos admirados e satisfeitos. A visão da coroa solar, por si só, já os deslumbrava. E as estrelas, sempre ofuscadas pelo Sol, puderam ser vistas e fotografadas. O eclipse durou cinco minutos e 28 segundos. O dia clareou. Os galos se calaram. A Teoria da Relatividade estava comprovada. Existia uma nova teoria do Universo.
Há um século, portanto.
http://www.fisica.net/relatividade/o-eclipse-de-1919.php
http://centenarioeclipse.sobral.ce.gov.br
Em 1999, em comemoração aos 80 anos do fenômeno que ajudou a comprovar a Teoria da Relatividade, a Prefeitura Municipal de Sobral criou o Museu do Eclipse (foto). Situado no local em que a expedição científica realizou suas observações astronômicas, sua arquitetura arrojada, com projeto do sobralense Antenor Coelho, tem a forma de duas meias luas. Elas ficam parcialmente no subsolo, não agredindo o projeto urbanístico da praça. Em sua exposição permanente, o Museu exibe painéis com mapas e fotos de Sobral (na época do eclipse), dos integrantes da expedição e dos instrumentos por eles utilizados. Uma luneta que pertenceu a Henrique Morize, o astrônomo que chefiou a comitiva brasileira de 1919 em Sobral e diretor do Observatório Nacional na época, também está no museu, além de jornais de novembro do mesmo ano, com os resultados das observações do eclipse em que se comprovou a teoria de Einstein.