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25 outubro, 2019

O passado nos espreita

por Fernando Gurgel Filho
O Brasil, que dizem ser "o país do futuro", está sempre forçando seu povo a andar para trás.
Há décadas e décadas e décadas que os países de melhor qualidade de vida deram uma guinada certeira em direção ao bem-estar da sociedade, graças aos investimentos em educação, saúde e proteção social, e conseguiram, desta forma, se desenvolver e, indiretamente, obter ganhos de segurança e qualidade de vida para toda a população. Elogiamos sempre esses países que tiveram a felicidade de se livrar do passado, algumas vezes tenebroso, e partiram felizes rumo ao futuro. Portugal é um belo exemplo para nós.
Mas não seguimos seu exemplo. Ficamos atrelados, submissos e rastejamos para um passado que nos aponta uma política de hegemonia mundial - - mais atrasada e ultrapassada do que certos artefatos que nossos bisavós usavam.
Assim como, por exemplo, achar que o mundo está ameaçado por comunistas que irão comer nossas criancinhas e tomar nossos carros e nossas casas, enquanto os bancos nos tomam os carros financiados por não termos como pagar, o neoliberalismo e a preocupação com o futuro nos fazem perder nossas casas e a fome come nossas criancinhas por não termos como alimentá-las. Triste e infeliz realidade, esta que sempre assombra a nossa sociedade.
Enquanto isso, o país, que nos faz retroceder econômica e socialmente, em nome de uma hegemonia que não existe mais - - e talvez nunca tenha existido - - e de um liberalismo que nunca aqui existiu, faz com que nossos doutos analfabetos funcionais (com diplomas de doutorados) abominem uma China maoista que não existe mais, uma Rússia stalinista que não existe mais, uma Cuba comunista que não existe mais... Isto ainda depois de décadas e décadas e décadas. Tudo isto para nos jogar no esgoto da história e nos levar a um passado tenebroso, do qual apenas eles têm saudades.
Assim, como dizia o grande Millôr Fernandes: "O Brasil tem um enorme passado pela frente". (*) Talvez até mais cruel do que o passado de nossos antepassados portugueses que invadiram a Terra Brasilis em 1500.
Talvez até anterior a isto. O passado e o atraso não têm limites.

(*) "No momento em que aumentam as nossas descobertas arqueológicas fica evidente que o Brasil tem um enorme passado pela frente. Ou um enorme futuro por detrás, se preferem." (Millôr, ampliado)

A exposição do Instituto Moreira Salles, que esteve em cartaz no Rio, em 2016, foi a primeira retrospectiva dedicada exclusivamente ao trabalho plástico de Millôr, que, também escritor e tradutor, se definia a si mesmo como jornalista. Grande parte da sua obra plástica se desenvolveu para veículos de imprensa impressos, da revista "Cruzeiro" ao histórico "Pif-Paf", que teve poucos números durante a ditadura, à revista "Veja". Um dos motivos explorados foram os militares e sua vaidade, na série em que aparecem ao lado de pavão. Desenho, s.d. Nanquim, ecoline e grafite sobre papel, 26,3 x 22,2 cm. ACERVO MILLÔR FERNANDES / INSTITUTO MOREIRA SALLES

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