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15 julho, 2017

Chico Buarque, a Globo que faz a diferença e o fradinho do Henfil

por Luis Nassif , GGN
Existem o João e seu cunhado Francisco. João, de alcunha Gilberto, é sempre pule de dez; Francisco também Buarque, é uma seta certeira. Um ou outro já consagra a vida de qualquer foca. Basta uma frase, um bocejo, uma poesia do Tejo, um resmungo, um suspiro, qualquer coisa que se extraia de boca de um ou outro, é como a pepita rara bem no fundo da bateia, pouco importa a areia que sempre o editor coloca: quem entrevista o Chico, nunca mais será um foca.
Maranhão no fechamento, pensando na roda de sexta, ouve o Ascânio gritar: esqueçam os bacharéis, esqueçam os empresários, deixem Temer e seus sicários, data venia, e os infiéis, esqueçam a malta das ruas, as fontes indignadas, nem me fale em jogadores, em paspalhos ou atletas, parem as rotativas que quero ouvir os poetas chorando gotas de sangue, arrancando os cabelos, quero ouvi-los furibundos, maldizendo Deus e o mundo e a falta de futuro que aguarda seu presidente.
E ouviram os artistas de variada extração. Ouviram Silvia Buarque e o indefectível Lobão, e também Beth Carvalho e o famoso Barretão. Ouviram até Zé Padilha que tratou de caprichar, apurando o vernáculo com o mais chique que há, introjetando na frase a finesse de um "quiçá".
Mas o Ascânio, insistente, bateu o pé e exigiu: quero aqui um peso pesado, dizendo o que quiser. Foi então que um anjo torto soprou na sua orelha: se o Globo agora ousar mostrar alguma isenção, e salvar a cobertura das torpezas de esquerdistas, suas verrinas, seus fuxicos, já temos a solução: bota alguém pra ouvir o Chico. Ele fala e sua frase fica no meio de outras, pagamos a penitência, mostramos a tolerância, não damos nenhum destaque e ela morre no ar.
E foi assim que de noite, por volta das 20 horas, saiu o jovem repórter atrás da sua matéria. Ligou para o intermediário que frequentava o Olimpo e tinha acesso a Zeus, e pediu a frase santa, que seria a água benta batendo em testa de ateu: se conseguisse a frase, nunca mais o purgatório da reportagem geral: iria direto pro céu.
O produtor, cauteloso, levou o recado ao Chico. Ele negou de imediato, mas depois, considerou. Seus olhos brilharam estranhos, parecia estar a mil, andou de um lado a outro, abriu o baú de lembranças e de um Pasquim amarelo, saltou o Fradinho do Henfil.
Sem demora esculpiu frase de quatro palavras: e não era de sua lavra, muito menos do Henfil.
O repórter reportou para o chefe de plantão que gritou para o Ascânio: temos a frase de Chico, e, para nossa surpresa, finalmente ele admite o mérito de nossa imprensa. E, em letras garrafais se lia o elogio mendaz: Globo faz a diferença.
Aí o velho fantasma, a alma de dr. Roberto, que sempre andava por perto vigiando suas crianças, rugiu como vento rascante: Ascânio, ó seu demente, veja o que tem na sua frente e não me exponha ao ridículo, que a intenção do "textículo" é fazer troça da gente
E foi assim que a frase não saiu mas pouco importa. Para evitar mais atrito é possível que inspire um novo samba de Chico.
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O tempo mítico
Abaixo, um vídeo da música "Maninha", composta por Chico Buarque em 1977, na interpretação de Chico e Miúcha, mais alguns comentários do compositor sobre a música. Ao piano, Tom Jobim.



... pois hoje só dá erva daninha
No chão que ELE pisou.
... um dia ELE vai embora, maninha
Pra nunca mais voltar.

À primeira ouvida, traz a sensação de recordação de bons tempos que acabaram contra a vontade do EU que conta a história. Chega a dar a impressão de um mal de amor sofrido por alguém que foi abandonado. Chico conta que, na época, gostaria de escrever algo com a palavra "maninha" porque muito já se havia escrito com ela (assim como iaiá ioiô) e acabou por compô-la para Miúcha cantar, não pelo fato de serem irmãos. Segundo ele, maninha, na canção, tem o sentido de "querida". A música tem um tom metafórico muito utilizado nos anos 70, época do regime militar brasileiro. O próprio Chico, diz, no documentário "Vai passar", que o pronome ELE, do texto de Maninha, referia-se à situação da ditadura. Diz o compositor: "é uma canção zangada disfarçada de delicadeza, falando de uma infância imaginária". O país estava sob a repressão militar, (e a música)  é capaz de despertar uma nostalgia, uma saudade e uma procura pelo que fez algum sonho naufragar em nossa própria vida.

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