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07 dezembro, 2012

Uma experiência absurda e dolorosa

Prezados amigos,
Passei hoje (27/10) por uma experiência terrível, absurda, dolorosa, que ocorre contra os ditames da natureza: ver um pai e uma mãe jovens enterrando uma filha de menos de três anos de idade.
Trata-se de uma sobrinha linda, meiga, inteligente, que foi submetida a uma cirurgia de amígdalas e adenoides no Hospital(?) da Unimed em Sobral. Coloquei um ponto de interrogação porque não conheço o local mas quem o conhece, favor diga-me se é um hospital ou um disfarce.
Minha sobrinha, numa cirurgia que ocorreu sem problemas (não sei, alguém sabe?), apresentou um sangramento no pós-operatório imediato e, segundo relatos de leigos acompanhantes, começou a ficar cianótica e com intensa dificuldade respiratória. Começa o corre-corre, sem ninguém apto a fazer alguma intervenção benéfica, quando chega um dos médicos (participou da cirurgia) e ao ver o estado da criança, pasmem!, toma-a nos braços e sai correndo em direção ao seu carro, para levá-la à Santa Casa de Sobral. A criança foi levada, junto com a mãe, até o interior do centro cirúrgico da Santa Casa, onde foi improvisado um leito intensivo, com a assistência de diversos e esforçados médicos e outros profissionais, mas numa torre de Babel nada favorável à pequena paciente.
Esforços no sentido de trazer a criança para uma UTI de Fortaleza foram feitos, infrutíferos, pois a criança teve uma parada cardíaca (foi a primeira? foi a segunda?)na entrada do avião. Até então os contatos com familiares eram evasivos, rápidos e mais geradores de ansiedade do que informativos.
Ao final, o corpo da criança foi entregue à família: deformado, edemaciado (minando água, como dito pelos leigos), com marcas de dreno no tórax, traqueostomia e acessos venosos. À família nada mais restou do que agradecer o empenho de todos, o esforço desmedido e a incumbência de enterrar uma infante que foi se submeter a uma cirurgia tão simples como uma adenoamigdalectomia. Esclareça-se aqui que a família sente-se grata e reconhece o esforço dos profissionais envolvidos mas, em todos, ficou uma sensação: faltou alguma coisa!!!! Ou várias coisas???!!!
Não estou aqui culpando médicos, não tenho procuração da família para tal. Não me move raiva ou vingança; move-me a dor. Não participei diretamente dos atos, estava longe, em Fortaleza, sofrendo e antenado continuamente nos acontecimentos. Sabe-se que todo procedimento médico, por mais inocente que seja, tem uma certa margem estatística de evoluir para um desfecho desfavorável. Qual é o nosso papel, de cuidadores da saúde dos outros? Minimizar ao máximo a chance de ocorrer um evento negativo, até porque, citando Murphy, em caso de uma mínima chance de algo desfavorável acontecer, este algo vai acontecer.
Para começar, creio que faltou estrutura ao hospital(?) da Unimed. Aí se leia equipamentos, dependências (UTI), treinamento etc. Não seria o caso de (depois que fosse resolvida a dúvida se se trata realmente de um hospital), de se fazer um estudo das condições desta instituição, envolvendo a própria Unimed, o Conselho de Medicina, a Vigilância Sanitária, o Ministério Público etc, para que se evitem outros sacrifícios de inocentes nos altares dos deuses da Medicina?
Para terminar, creio que falta estrutura ao município de Sobral para resolução de casos semelhantes. Não existe UTI Pediátrica em Sobral. Este escriba, na qualidade de intensivista e auditor da SESA, já fez inúmeras denúncias, nos mais diversos fóruns, desde o tempo em que o atual governador era prefeito daquele município, sobre o absurdo que é a inexistência de leitos intensivos pediátricos em uma cidade que é sede de uma macrorregião de saúde que abrange cerca de 1.500.000 habitantes. Nossa Sociedade Cearense de Terapia Intensiva já publicou vários comunicados na imprensa em que, entre outros casos, denuncia este acinte à saúde da população local. Ressalte-se que para ser sede de macrorregião de saúde, o município se compromete, na pactuação devida, a desenvolver competências e habilidades, entre as quais o atendimento de doenças críticas de todas as faixas etárias.
Sabe-se também que tanto a Santa Casa como o Hospital Regional a ser inaugurado (após sucessivos adiamentos) deverão contar com este tipo de equipamento. Será? Sabe-se que a escassez de recursos humanos capacitados no tema, principalmente médicos, é uma séria realidade e que só será resolvida com a aplicação de medidas específicas (tais como possibilidade de carreira, carga de trabalho adequada, remuneração decente, etc.). Seria muito interessante pesquisar quantos pacientes são encaminhados de Sobral para Fortaleza, mensalmente, com afecções que deveriam, contratualmente, ser atendidas e resolvidas no âmbito daquela macrorregião.
Como sempre fiz, estou disposto a colaborar no sentido de se achar uma solução para este problema. Egoisticamente digo: não quero mais perder nenhum sobrinho por deficiências na assistência à saúde dos cidadãos. E creio que todos os sobralenses também querem isto.
Saliento que escrevo estas linhas sem acesso a dados específicos, o faço apenas com o que tenho guardado na minha cabeça, o momento é de muita dor e não de precisão estatística. Desde já, peço desculpas caso algum profissional sério se sinta atingido com meus comentários.
Despeço-me de todos enviando um beijo à minha querida Isabella, que hoje, de surpresa, se tornou mais uma estrelinha no céu.
Joel Isidoro
(médico e tio)

PARTICIPE DESTA CAMPANHA
LINK para uma petição eletrônica criada por Fabrício G. Brasil, e com 2.625 assinaturas até o momento, em que se pede para pôr em funcionamento uma UTI Pediátrica em Sobral.

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